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Independência do Brasil

Atualizado: 11 de fev.

Ideias expostas em reunião (5/9/2022) com André Martin (USP) e José Messias Bastos (UFSC)



1. O processo da Independência das colônias latino-americanas ocorreu no início do século XIX como um capítulo do impacto mundial da Revolução Francesa. Dois outros acontecimentos da segunda metade do século XVIII afetaram o mundo, a Revolução Industrial Inglesa e a Independência dos EUA. As colônias da América Latina foram afetadas por esses três grandes acontecimentos e estimuladas pela insígnia de liberdade, igualdade e fraternidade. No Brasil José Bonifácio de Andrada e Silva, um dos líderes da Independência, propunha o fim da escravidão e o regime republicano.


2. Quais foram os rumos trilhados pelas colônias latino-americanas? As colônias espanholas desde os princípios do século XIX escolheram o caminho da expulsão das tropas espanholas, mas seus chefes militares vitoriosos San Martin (Argentina), O’Higgins (Chile), Bolívar (Colômbia) e outros acabaram exilados, pois as elites feudais não toleraram liberdades consideradas excessivas. O caminho da Independência do Brasil foi mais demorado e menos militar e manteve a monarquia e a escravidão. 


3. O rei português D. João VI transferiu a corte para o Brasil diante da invasão francesa e, em 1808, decretou a abertura dos portos ao comércio exterior, antes monopólio português, favorecendo a Inglaterra. Tratou-se da primeira medida do longo processo da Independência, seguida pela criação do Reino de Portugal, Brasil e Algarves após a expulsão dos franceses em 1815 e do retorno do rei a Portugal em 1820, orientando seu filho a ficar no Brasil e liderar a Independência, pois a Inconfidência Mineira e as revoltas de 1817 ao norte indicavam que cedo ou tarde a ruptura ocorreria.


4. Assim, a Independência proclamada por Pedro I em 1822 foi diferente das independências das colônias espanholas, mais fragmentadas do que as unidades administrativas coloniais. Na verdade, Portugal desde o século XVIII, sob a administração do Marquês de Pombal, adotou a política do “despotismo esclarecido” e tratou de enfrentar os problemas de cima para baixo, evitando conflitos de baixo para cima. Esta política deu origem ao Brasil de grande extensão territorial, com enormes recursos naturais, população numerosa, crescimento econômico rápido e candidato a liderar a América Latina.


5. Nos referimos linhas acima às revoltas de 1817 no Nordeste, reprimidas duramente por D. João VI, e que voltaram a ocorrer em 1824, com muita força em Pernambuco, sob liderança dos comerciantes de Recife e se estenderam à Paraíba, Rio Grande do Norte e ao sertão do Ceará, sobretudo no Crato e reprimidas por D. Pedro I. É importante lembrar que os comerciantes propunham uma Independência mais radical, por um regime republicano e o fim da escravidão e neste segundo levantamento armado propunham a Confederação do Equador independente da monarquia brasileira. O conflito evidenciava interesses diferentes das classes sociais e das regiões, pois os sertanejos do Crato, como os demais sertanejos do Nordeste abasteciam de gado o litoral açucareiro, com vínculos internos mais do que externos, além do sistema feudal precoce e não escravista. No litoral os senhores de engenho de açúcar eram menos radicais, pois queriam preservar a escravidão e vinculavam-se ao mercado externo, além do medo que se repetisse no Brasil o processo de independência radical do Haiti e por isto preferiram D. Pedro I. Estas considerações importantes foram expostas por Evaldo Cabral de Mello (A outra independência, 2004).


6. A importância de Pernambuco na Independência brasileira tem profundas raízes históricas, tendo sido a capitania hereditária de maior peso econômico e político nos primeiros séculos coloniais, com sucesso na produção açucareira e importante atuação militar. Tropas pernambucanas foram enviadas ao norte da África na expedição fracassada do rei D. Sebastião, assim como tiveram participação decisiva na expulsão dos franceses do Maranhão e mais importante ainda na expulsão dos holandeses no litoral açucareiro do Nordeste, com a união de brancos, negros e indígenas.


7. Após a Independência, tropas militares portuguesas estacionadas na Bahia e no Maranhão continuaram defendendo a soberania de Portugal sobre aqueles territórios. Entretanto, senhores feudais do sertão, como o avô de Castro Alves, armaram seus subalternos e chefiaram a expulsão dos portugueses em 1823. No Brasil independente constituiu-se uma Assembleia que teve dois membros titulares afrodescendentes, Antônio Pereira Rebouças e Francisco Jê Acaiaba de Montezuma, mais tarde Visconde de Jequitinhonha, ambos participantes ativos da Independência da Bahia (2 de julho de 1823). A Assembleia Constituinte foi dissolvida por D. Pedro I em 1824 visando combater militarmente à Confederação do Equador, evidenciando os percalços da monarquia recém-nascida e a primeira Constituição foi outorgada.


8. José Bonifácio de Andrade e Silva, cognominado o Patriarca da Independência, era filho do maior exportador de açúcar de Santos-SP, que lhe garantiu estudos de ciências naturais em Portugal, onde adquiriu uma visão de conjunto da vinculação metrópole-colônia. Era a favor de várias causas progressistas como: o regime republicano, o ensino público, as populações indígenas e o fim da escravatura. Seus irmãos participaram das revoltas de 1817, um deles morto e o outro preso, como ocorreu com antepassados de Ignacio Rangel, igualmente intelectuais progressistas. Assim, diante da realidade concreta, José Bonifácio, republicano e antiescravista convicto, achou melhor aderir à proposta de D. João VI de tornar seu filho Imperador do Brasil. José Bonifácio tornou-se o principal articulador político visando a adesão de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo a este importante projeto português de “despotismo-esclarecido”, lição que foi aprendida pelas classes dominantes brasileiras desde a Independência.


9.  As comemorações da Independência em 1922 e em 2022 foram muito diferentes e revelaram muitos detalhes dos políticos e dos intelectuais brasileiros. As comemorações em 1922 foram otimistas e bem-organizadas. No Rio de Janeiro foi organizada uma exposição que ocupou área superior a 2.000 m2, com a participação de todos os estados brasileiros e de 14 países. Na ocasião ocorreu a primeira transmissão de rádio no Brasil, com discurso do presidente Epitácio Pessoa e da sinfonia O Guarani, no Teatro Municipal. Também aconteceu a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, com dois pilotos portugueses, a família real teve membros em visita ao Brasil e foi inaugurado o famoso hotel Copacabana Palace. Em São Paulo além da sua famosa Semana de 1922, foi reaberto o Museu do Ipiranga (Estadão 7/9/2022).

Em 2022 tivemos apenas textos pessimistas de inúmeros intelectuais, enfatizando lados negativos, como os do historiador José Murilo de Carvalho ao afirmar que “nosso projeto de nação faz 200 anos e não se realiza”, insistindo em dizer que “não temos um projeto de nação, algo como o ‘Destino Manifesto’ dos norte-americanos” (Estadão 3/9/2022). Ele certamente ignora que o Brasil, o Japão e a URSS foram os países que mais cresceram no mundo no período de 1930 a 1980, com o pioneirismo na extração de petróleo em águas profundas, na produção de álcool combustível, coisas que não agradavam o país do “Destino Manifesto”. Vale a pena relembrar Nelson Rodrigues quando dizia que “O Brasil é muito impopular no Brasil”.


10.  À guisa de consideração final vale a pena mencionar o padre jesuíta Antônio Vieira, de origem portuguesa modesta, com avó afrodescendente pelo lado paterno e que viveu no Brasil açucareiro do nordeste do século XVII onde constatou a convivência de portugueses e africanos escravos, de maneira tolerante, incluindo os judeus exilados de Portugal, onde a Inquisição não vingou. Fez questão de assinalar num dos seus sermões a futura importância do Brasil como um exemplo cultural para o mundo. De maneira semelhante é a ideia de Domenico de Masi (O futuro chegou, 2014), assim como a ideia do homem cordial, de Sérgio Buarque de Holanda e também de Câmara Cascudo ao dizer que “o brasileiro é o que o Brasil tem de melhor”. Tudo indica que nossos inimigos externos e internos não nos vencerão.

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