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Economia e política

Folha de S. Paulo (22/11/1989)


As eleições presidenciais, mesmo antes do segundo turno, já estão mostrando o cariz de um verdadeiro terremoto social, em toda a significação desse termo. Econômico e político, para começar. Mas podemos estar seguros de que nada escapará ao tsunami ou vaga de fundo, de mudanças.


Do ponto de vista econômico, os prescindenciáveis disseram, até agora, muito pouco que valha a pena reter. Fala-se em acabar com a inflação, em refazer a distribuição da renda, em liquidar a corrupção etc., como se tudo isso fosse mera questão de querer, bastando estalar os dedos. As fábulas que inspiraram os notórios “pacotes” e “choques” teimam em não morrer. Do ponto de vista político, os mitos também persistem.


Fala-se em presidencialismo e parlamentarismo, como se fosse questão de preferência. Na Velha República, os presidentes tinham, formalmente, poderes imperiais. Na prática, não era assim, porque o colégio dos governadores limitava muito esses poderes. E cada governador tinha os seus poderes limitados pelos “coronéis” ou caciques de campanário. Governadores e coronéis perderam muitíssimo dos seus antigos poderes, mas isso não quer dizer que os poderes que eles perderam tenham passado aos presidentes, o que faria destes verdadeiros ditadores.


Esses poderes perdidos devem ser buscados algures, mas, temporariamente, nenhures, o que nos deixa com um Estado débil, incapaz de fazer frente aos problemas pendentes. Aos problemas econômicos, em primeiro lugar.


Supusemos resolver este problema da evidente disparidade entre os poderes efetivos do Estado e a enormidade e instância dos problemas a resolver. É claro que não basta que o Estado seja forte para resolver os problemas, porque mesmo sendo forte, não resolverá problema algum, se deste tiver uma visão equivocada, como estas que se exprimem pela lógica capenga que tem informado nossos sucessivos “pacotes” e “choques”. A mesma lógica, no fundo, que pudemos surpreender nos vários “discursos” dos prescindenciáveis.


Até certo ponto, foi até bom que o Estado fosse débil, porque isso livrou-nos de males maiores, bem maiores. (Imagine-se um “Plano Verão” nas mãos de um governo forte.) Mas isso não quer dizer que devamos desejar um governo mais débil que o que temos, um governo virtualmente inexistente. Significa apenas que, paralelamente com o fortalecimento do Estado, deveremos cuidar de estudar melhor os problemas a resolver.


Esse governo rejuvenescido não pode ser esperado de umas eleições que mostraram a sociedade fragmentada, ao ponto de levar-nos à escolha de um chefe do Estado com 17% ou 27% dos votos. A menos que... Sim, a menos que cheguemos ao objetivo de fortalecer o Estado pelo caminho lógico da implantação da prática da coalizão.


O parlamentarismo é o resultado lógico da instituição da coalizão como forma normal, estável, de governo. O coroamento dessa tendência. Entretanto, isso não quer dizer que somente depois de instituído um regime parlamentarista poderemos esperar um governo operante. Os debates que se prenunciam nesta preparação do segundo turno têm, desde já, um sentido parlamentarista, até porque já devíamos saber que nossas revoluções costumam ser atos homologatórios de mudanças já acontecidas, no fundamental.


Noutros termos, nosso Estado já é potencialmente forte, por força desses arranjos preterintencionalmente parlamentares. É isso o que nos confere, aos economistas, inclusive, o dever de estarmos preparados para propor medidas sérias para a superação dos problemas pendentes.


Se esses arranjos se frustrarem, nada feito. Mas, se não se frustrarem, será um desastre se não houvermos amadurecido soluções sérias para os problemas pendentes. Não estas falsas soluções que encontraram expressão nos discursos de nossas duas dezenas de presidenciáveis, que não passaram de exercícios ingênuos, quando não virtualmente tolos, de voluntarismo.

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