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O dólar e os preços mundiais

Atualizado: 11 de fev.

Folha de S. Paulo (10/08/1989)


Não nos faltam projetos que, como alternativa à indexação de nossas moedas — já que as mágicas orientadas a acabar com a inflação por decreto, por decretos-leis ou medidas provisórias, inspiradas na peregrina teoria da inércia da sobredita inflação, provaram repetidamente sua inanidade — propõem a dolarização de nossas economias. O dólar norte-americano — pode-se argumentar —, sobre ser uma moeda de poder aquisitivo tão estável como a melhor OTN, é uma moeda universal.


Ignoro se as pessoas que assim pensam já submeteram essa teoria ao teste de uma excursão turística pela Europa, por exemplo. Não uma excursão principesca, provavelmente financiada pelo nosso Tesouro Nacional, mas uma "budget excursion", com dólares contados, como esses que o Ministério da Fazenda nos permite viajar. E, sobretudo, uma excursão acompanhado por nossas respectivas mulheres que, sabendo o que se pode comprar com nossos instáveis "cruzados", podem comparar esse poder de compra com o dos mesmos cruzados, depois de passados pelo duplo cadinho do dólar-turismo e da conversão deste em liras, francos ou dracmas.


Isto feito, fácil será ver que a representatividade do dólar, como padrão do poder de compra, é uma ilusão. Que o que se pode comprar com os cruzados, depois de passados pela dupla conversão em dólar-turismo e em moedas estrangeiras, não tem nada que ver com o que, no Brasil, poderíamos comprar com a moeda não convertida.


Nem a otenização, nem a dolarização constituem remédio para a inflação. Ainda gastaremos algum tempo, mas acabaremos por persuadirmo-nos de que não carecemos de remédio contra a inflação, pela simples razão de que a inflação não é uma doença mas sim uma reação, no fundo saudável, do organismo econômico, contra um mal verdadeiro, representado pela depressão econômica.


Carecemos, é certo, da indexação de nossa moeda, não porque isso seja o remédio, que não é, contra a inflação, mas porque é indispensável para a retomada da atividade econômica. A queda da taxa de inflação virá, por sua vez, como consequência da aludida retomada da atividade econômica. Sem perdermos de vista que, para esse efeito, a oteenização — ou que outro nome atribuirmos à indexação da moeda — tem utilidade que a dolarização não pode ter.


O dólar é, hoje, uma das moedas mais doentes do planeta. É a moeda de um Estado endividado, de um país também endividado. Imaginar que tal moeda possa continuar a ser, já não direi um meio universal de pagamento, mas um simples padrão de valor, é o que pode haver de mais descabido.


As anomalias que, como turista, se encontram nos preços relativos universais, no ato de comparar os preços específicos de outros mercados nacionais, reflete a precariedade do instrumento utilizado, isto é o dólar norte-americano, tal como ele nos chega de Bretton Woods.

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